quarta-feira, 16 de abril de 2014

Opiniões X - A senhora de Castro Laboreiro







































Provavelmente o comentário mais intenso que alguma vez recebi... 

Excelências,

Ditou-me a sorte e o infortúnio que nascesse nos contrafortes da Serra da Peneda, mais precisamente no lugar da Seara da Freguesia de Castro Laboreiro.

A sorte permitiu-me que cedo abalasse encostas abaixo e “a salto” descesse a Entrimo, por carreiros que anos de pastorícia me tinham ensinado, subisse as encostas de Bande até criar raízes em terras Galegas, onde, desde há anos sou benificiário do “SERGAS”, que em nada enferma das maleitas do SNS, das bandas de lá do Lima.

O infortúnio, de ter deixado a minha querida mãe, que já conta mais de oitenta e cinco Primaveras, nas varandas da Corga dos Enforcados a 150 quilómetros da capital do Distrito.

Mas nem a sorte de poder respirar os ares da serra, o cheiro das urzes e das carrascas, preveniram as cicatrizes que as amarguras da vida e os anos de solidão deixaram na minha mãe. A dor de ter de ver partir os seus oito filhos, a solidão e a incerteza de poder ver regressar os netos a este País que teima em cavar sepulturas em vez de alicerçar Maternidades, quase a mataram.

O infortúnio de ter que suportar as mazelas que os anos trazem aos seios que deram de mamar aos oito filhos que a custo criou, e que agora os Médicos lhas palpam com a força, que nenhum dos mais esfomeados e irrequietos dos seus pupilos o tinha feito.

Foi então num vaivém entre Castro e “Biana”, que lhe disseram, lá no hospital, que tinha uns “caroços” nos seios, que a obrigavam a ir fazer uns exames ao Porto.

Ao Porto senhor doutor, perguntava a minha pobre mãe, com tanto de assustada quanto de incrédula. Sim minha senhora respondia educadamente o médico. Mas vocês aqui não fazem senhor doutor? É que eu nunca fui ao Porto. Retorquia a minha mãe.

Com paciência pouco habitual lá foi dizendo o médico. Só no Porto minha Senhora; tem que ser no Porto.

Excelências;

Castro Laboreiro fica a 250 quilómetros do Porto, sendo que a viagem mais próxima é com parte do percurso em estradas Galegas! Na melhor das hipóteses a viagem, ida e volta, demora cinco horas. A idade da minha mãe e de outras mães do Distrito de Viana do Castelo, já não suportam os abalos que as centenas de curvas e de euros que nos separam do Porto.

Senhoras e Senhores Deputados da Nação;

Rogo-vos em nome da minha mãe e de outras mães do Distrito de Viana do Castelo, pois julgo que tal nobre apelo, por tão nobre causa, me perdoam deste altivo impulso, que perguntem a quem, o direito de o fazer Vos assiste:

Qual a razão dos habitantes de Viana do Castelo, Mulheres e Homens se de deslocarem ao Porto para fazer exames radiológicos?
Existem ou não meios técnicos no Distrito para dar uma resposta a esta situação?

Que fundamentos justificam tão violentos sacrifícios e avultados custos?


(foto retirada da internet, sem qualquer relação com a pessoa em causa) 

4 comentários:

  1. Eu pessoalmente quero aqui lançar um desafio, particular, a todos os residentes do Distrito de Viana do Castelo que tenham acesso a este post, Homens e Mulheres; Pais e Filhos, a coragem de o divulgar nas redes sociais. Copiem e coloquem no mural da Vossa página contra uma moral que não existe.
    Lançar um outro desafio aos Deputados do Distrito de Viana do Castelo e eventualmente outros que não deixem passar em claro este constrangimento no acesso aos meios elementares de diagnóstico e terapêutica.

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  2. Eu quero agradecer ao senhor administrador do blog pela forma como tratou o assunto e dizer a todos que a minha avó não fez o exame porque não tinha dinheiro para o taxi.

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  3. Realmente é uma vergonha. Mas como se diz por algumas bandas é o que temos. Contava há dias uma Senhora no Centro de Saúde dos Arcos de Valdevez que tinha chegado a casa depois de ir fazer um exame ao Porto às duas da manhã, mas que o Senhor Presidente da Câmara nada faz!

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  4. Partilho a opinião de que há muito pouco bom senso e humanidade na reestruturação da Saúde. No entanto, gostaria de corrigir algumas imprecisões deste artigo. De acordo com o Google Maps,Castro fica a 140 Km do Porto indo por Braga e a 160 indo por Valença e apanhando mais cedo a A3 (e não a 250km como é dito). O tempo de percurso é entre 1h40 e 2h (e não 2h30).
    O problema é que Viana não está muito mais perto, está a 120km (e de acordo com o G-Maps demora 1.40m, isto é quase o mesmo tempo).
    A verdade é que há um problema com prestar serviços de saúde em regiões remotas. Não é um problema em Portugal. É um problema em qualquer parte do mundo, que gera discussões idênticas e zonas como a Noruega, a Escócia, a Bretanha, ou as ilhas Gregas e Italianas. O problema é que havendo pouca gente não pode haver um especialista, pois este especialista sendo (por definição) especializado num tipo muito especifico de doenças que só afectam 1% ou 0,5% da população a cada x anos, não teria casos suficientes por ano para se manter como especialista. Há aqui um equilibrio entre duas más soluções que tem de ser encontrado. Ou temos proximidade, mas sem especialização e as pessoas andam pouco mas encontram médicos muito generalistas e que não vão ser os melhores - o que é mau, ou temos de os ter mais concentrados e então isso vai obrigar a maiores deslocações. Nenhum país conseguiu encontrar uma solução ótima para este problema em zonas remotas. Temos de tentar fazer o melhor e que ter em atenção as dificuldades de mobilidade e sociais das pessoas que vivem nestas regiões. Mas não há soluções nem fáceis, nem baratas, nem verdadeiramente justas, se pensarmos que o justo era que se conseguisse dar a quem está em castro Laboreiro, um serviço médico de próximidade tão bom como a quem está no Porto. Em algumas doenças o médico especialista teria um doente por ano, a menos que os outros 300 ou 400 que atende se deslocassem do Porto a Castro Laboreiro. A minha solidariedade. O Meu abraço. Mas o meu aviso a todos os que aqui se solidarizam. Não há soluções fáceis para este problema. Nem em Portugal. Nem em nenhum país que eu conheça.

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