sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Memorando da triagem de Manchester para o Sr Bastonário da Ordem dos médicos














Estou incrédulo, indignado e revoltado, o profissionalismo dos enfermeiros foi posto em causa injustamente, com base em pressupostos que não têm qualquer fundamento.

Vejo na TVI uma reportagem onde é dito pela Ordem dos médicos (OM), que a Triagem de Manchester (TM) é mal feita pelos enfermeiros e que deveria ser feita por médicos, pois têm mais competência para efectuar um diagnóstico. Exemplificam com um caso, onde foi dada uma pulseira verde (pouco urgente - tempo máximo de espera 120 mnts) a uma doente, que no momento de observação médica entrou em paragem respiratória.
De seguida vejo a reacção do Bastonário da Ordem dos enfermeiros e, por muito que se tenha esforçado, não deu uma resposta à altura e devidamente justificada, mas dou-lhe um desconto porque a sua área, enquanto profissional, nada tinha a ver com triagem e urgência. 

Sendo assim e porque tenho várias centenas de horas de experiência em TM, sei que estarei à altura de responder à injusta e acima de tudo errada declaração da responsabilidade da OM, proferida por alguém que notoriamente não tem consciência nem conhecimento do que é a TM.

Para quem desconhece e para contextualizarmos, a TM é um sistema de classificação de prioridades e encaminhamento dos utentes que recorrem ao Serviço de Urgência. É efectuada desde há 10 anos por enfermeiros, ou seja desde a sua implementação em Portugal. É um sistema aplicado em vários países e, posso quase garantir, que em todos eles é feita por enfermeiros.

No início da sua implementação foram criadas equipas de formadores (médicos e enfermeiros) que, numa sessão teórica e prática, num total de 8 horas (!),  explicaram os seus princípios e aplicação. Portanto trata-se de uma formação de curta duração e propositadamente de processos extremamente simples. Estes formandos eram em 99% dos casos, enfermeiros. Recuando, entre várias dezenas de enfermeiros, recordo um médico a assistir a esta formação, no entanto posso garantir que nem esse médico, nem nenhum médico em Portugal tem um minuto de TM na prática, e porquê? Porque rapidamente perceberam que a TM não é um sistema de atribuição de diagnósticos, como o Sr Bastonário da OM refere, porque rapidamente perceberam que era uma trabalho extremamente desgastante, onde têm que ser efectuada uma observação rápida e individual (1-2 minutos) de um número situado em 3 dígitos de doentes , por dia. Num turno de 8 horas, para um triador, poderão passar cerca de 150 utentes, onde lhe são colocadas questões simples, como p.e: “De que é que se queixa?”, questões e respostas pormenorizadas são sempre evitadas, porque esse não é o objectivo que está preconizado para a TM, esse será o objectivo do médico e do enfermeiro, no momento da observação clínica do doente, já num gabinete médico, numa sala de tratamentos, numa sala de emergência, ou em qualquer sala de observação, já no Serviço de Urgência propriamente dito. Portanto e para que o Senhor Bastonário da OM perceba, a TM funciona como uma antecâmara do Serviço de Urgência.

Devido a este volume excessivo de admissões de utentes nos Serviços de Urgência, problema já sobejamente conhecido e entranhado no nosso SNS e, como todas estas admissões “passam” pela TM, é fácil perceber que os erros podem sempre acontecer, como acontecem e irão continuar a acontecer, seja um enfermeiro, seja um médico a triar, caso o sistema de saúde e a mentalidade e cultura portuguesa se mantenham.
Além disso, está mais que confirmado que este sistema de TM criado no Reino Unido, tem as suas lacunas. É um sistema falível, facto já confirmado por vários profissionais (médicos e enfermeiros) da minha esfera profissional. Diariamente há várias situações onde o triador não consegue “encaixar” o problema do utente no sistema da TM, por isso, Senhor Bastonário, o erro aconteceu. Foi lamentável, foi um erro, mas aconteceu, como muitos outros aconteceram e como muitos outros acontecerão, seja um médico, seja um enfermeiro, o triador! Agora o que fazer para evitar? Revejam o sistema de classificação da TM! Encontrem soluções para a avalanche de admissões nos Serviços de Urgência!
Para que fique claro, os enfermeiros não se opõem que os médicos façam TM. Muitos até agradecem, porque não gostam de triar, e porquê? Porque além do que tenho dito, a TM é um local de grande risco e responsabilidade, quando algo corre mal, como se viu pela acusação do Bastonário da OM, os dedos apontam-se desde logo ao enfermeiro da TM. 

Mas o que o senhor Bastonário da OM não referiu, foram as infindáveis situações, em que o enfermeiro da TM tria um doente com prioridade laranja (muito urgente – tempo de espera máximo 10 mnts) e o médico critica a prioridade e acima de tudo o encaminhamento do doente, achando que é excessiva e incorrecta. Muitos destes casos são efectivamente urgentes, como Enfartes e AVCs e afinal o enfermeiro estava certo e o médico estava errado. 

O que o senhor Bastonário da OM se esqueceu, foi de referir que doentes triados com cor laranja para uma especialidade, por vezes esperam pelo atendimento muito mais do que os 10 minutos preconizados, por desvalorização ou pela não presença física no Serviço de urgência por parte do(s) médico(s) de determinada especialidade, o que faz com que muitas vezes o enfermeiro da TM anda feito “barata tonta” a sua  procura, para lhe comunicar pessoalmente que aquele doente precisa de um atendimento rápido, atrasando o seu próprio trabalho.
O que o senhor Bastonário da OM se esqueceu de referir foi, que há colegas seus que, mesmo estando desocupados, não chamam os tais doentes com pulseira verde, pensando talvez que a TM estipula um tempo de espera e não um tempo máximo de espera. O que quero dizer com isto é que, muitas vezes doentes com pulseira verde esperam 2 horas pelo atendimento, quando poderiam esperar 30 minutos.
Sintetizando, a TM é um sistema imperfeito e que tem que ser feito com rapidez, dando azo ao erro. Erros há muitos e quem os comete somos todos, seja construtivo e encontre forma de os minimizar! Senhor Bastonário da OM, repense o que disse e peça desculpa aos enfermeiros, caso contrário eu sou a favor de instauração de um processo contra si e contra a OM.

A Ordem dos Enfermeiros que acorde e não deixe passar impune esta acusação, ela existe essencialmente para a defesa da classe e é para isso que pagámos quotas!



segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Exaustão profissional! Eu avisei!



Burnout, distress, são alguns dos temas que dou mais relevo no PDDSE. Talvez porque sejam temas que me assustam... Vejam as etiquetas na barra lateral e confirmem.
Pois... tanto tenho falado, tanto tenho avisado, na esperança de que haja forte discussão, visibilidade, impacto, para que, quiçá, os responsáveis tomem medidas e... está aqui a prova: "Enfermeiros de Ponte de Lima acusam sintomas de exaustão"
Estes foram os que tiveram alguma iniciativa e expuseram o problema (neste caso ao SEP), mas o problema não fica só por Ponte de Lima, é demasiadamente amplo.
Quem trabalha em saúde sabe, que se contam pelos dedos da mão, as instituições a nível nacional, que têm nos seus serviços, profissionais em número capaz de responder às necessidades.
Com a sobrecarga para os que lá estão, vem isto e pior que isso, vem a diminuição da qualidade dos cuidados prestados



segunda-feira, 19 de agosto de 2013

A ceia do hospital


É tão bom trabalhar à noite e lá pras 3h, 4h da manhã, quando a fome aperta, comer a ceia!
Quem não gosta do pão, que se for lançado à cabeça de alguém, é capaz de provocar uma contusão?
Quem não gosta do pão de leite ou croissant que se desfaz em farelos ao toque, com sabor a plástico?
Quem não gosta do sumo ácido, muito bom para uma azia nocturna?
E o pacotinho de compota de sabor fabricado, cheia  de E´s, espessantes, conservantes, etc?
E a saqueta de descafeínado que ninguém usa?

Para quem não sabe, a ceia é constituída por um conjunto de "alimentos", se assim os podemos denominar, fornecida pelo hospital a todos os funcionários, no turno da noite.
É paga com o dinheiro do subsídio de alimentação de cada funcionário e é (pelo menos em Viana) má a todos os níveis: nutritivo, qualitativo.

Abro aqui um espaço de discussão sobre este tema, aberto também a profissionais de outros hospitais, de forma a tentar perceber como é a ceia nos outros locais.
Reclamem, sugiram! Abro uma página do facebook na expectativa de que se crie um movimento de indignação: "Por uma ceia decente"

Façam likes, comentem e partilhem, a ver se isto muda e nos tratam com um pouco mais de consideração!



quinta-feira, 8 de agosto de 2013

O emigrante está a mudar!

Tempo de férias, tempo de regresso dos nossos emigrantes.
Por estes dias, inevitavelmente, são vários os que vemos no Serviço de Urgência.
Reparo que andam mais calmos, mais ponderados, mais afáveis!
Ainda sou do tempo em que raro era o dia de Verão em que não haviam conflitos com emigrantes, as reclamações, as queixas eram habituais, algumas com razão, outras nem por isso, mas o espetáculo no corredor, esse, era quase sempre garantido.
Agora parece-me que a mentalidade, a postura mudou... haverá alguma explicação científica??
Confesso que no passado sentia-me irritado e ofendido quando diziam (frequentemente) que em Portugal era "o fim do mundo" e que em França é que era tudo muito bom, atitudes que geravam um certo esteriótipo desfavorável ao emigrante.
Agora já posso dizer que esse esteriótipo está a desvanecer-se e a aumentar o respeito e consideração que tenho pelos nossos emigrantes.