quarta-feira, 15 de abril de 2009

Desabafo de um Enfermeiro


Tomei a liberdade de publicar este texto que chegou à minha cx de correio electrónica. Desconhece-se o seu autor, decerto não levará a mal.

A UMA BOA CARTA PARA FAZER CHEGAR À MINISTRA DA SAÚDE.

Como Enfermeiro, estive hoje de greve assegurando cuidados mínimos. Revejo-me integralmente nas reivindicações da classe. Mas pergunto-me como as outras pessoas vêm a nossa classe, a nossa profissão, a nossa posição na sociedade. Será que não seremos o parente pobre de um sistema de saúde que só tem olhos para outros interesses…

Sou licenciado. Ganho como bacharel ou nem isso. Deveria fazer 140h por mês e trabalho 160 ou mais. Não recebo nada por essas horas a mais, acumulando horas. Tenho colegas com quase 200h positivas, ou seja, 200 horas que prestaram serviço de qualidade e que não viram compensado o esforço, e porque não dizê-lo, dedicação à causa pública, fazendo os possíveis todos os dias para não faltar nada em termos de cuidados de enfermagem. Essas 200 horas deveriam ser pagas como extraordinárias, ou melhor ainda, deveriam ser realizadas por um dos 5mil enfermeiros que actualmente não tem emprego. No meu serviço devem-se mais de 2000h. No meu hospital há umas dezenas de serviços e a média é nalguns casos superior. Devem-se no país, talvez um milhão de horas de cuidados. O que daria trabalho a mais 7000 Enfermeiros. E já nem estou a falar no aumento do numero de enfermeiros por cada turno, senão o número teria de ser ainda maior. No meu serviço, para 32 doentes, podem estar apenas 2 enfermeiros de serviço. E ao contrário do que por vezes pensamos (os enfermeiros pensam) só temos 2 mãos, 2 olhos, 2 pernas e 1 cabeça. E não somos omnipresentes.

Sou contratado há mais de 4 anos, trabalhando um pouco à margem da lei com contratos de 6 meses 'miraculosamente' renovados. Mas será que algum dia deixarão de precisar realmente dos enfermeiros para termos um contrato tipo 'hipermercado' ou pior? Depois, nestes 4 anos vi o meu ordenado ser aumentado pouco mais de 40€, ou seja 10€ ano. Não subi nenhum escalão, grau, etc, porque simplesmente não há carreira de enfermagem definida, e como contratado a coisa complica-se. Qual é o meu estímulo todos os dias? Apesar de ainda adorar o que faço, trabalho porque preciso do €€€€. É frustrante pensar que todos os anos ao contrário do que deveria ser, ganharei menos. Deveria ganhar como licenciado e ganhar horas extras se me fossem exigidas. Eu que ganho 6,5€ à hora, bem menos que alguns funcionárias da limpeza (sem desprimor para o seu trabalho), não me pagam horas extra. Mas pagar 2500€ por 24h de um médico, já é moralmente e legalmente aceite. Deixemos de ser hipócritas. Sou mal pago. Sinto todos os dias na pele, o peso e o risco desta profissão, que não é dar injecções e medir tensões. Está redondamente enganado quem dessa forma pensa. Somos um elo central nas relações clínicas, um peça chave. Quem esteve internado e já precisou de nós saberá a que me refiro. Formação adicional é sempre condicionada pelos serviços e instituições, num país que quer ter miúdos com computadores por todo o lado, num país em que se não formos doutores não somos ninguém, mas apelar a uma formação contínua, tendencialmente gratuita, é só para outras classes. A qualidade afinal é para outros verem. O doente que se trame.

Se tenho um curso de suporte básico de vida, devo-o a mim. 200€ e tem de ser renovado em 2-3 anos.
Se tenho um curso de suporte avançado de vida, devo-o a mim. 400€ e renovado em 2-3anos.
Se quero ser especialista, terei de ter pelo menos mais 6000€ de propinas para pagar. E depois, esperar que me aceitem numa instituição, que abram concursos, que se desbloqueiem verbas, etc. Um médico depois de médico torna-se especialista praticamente sem ir à escola em 6 anos. A prática é quase tudo. Nós seremos muito diferentes? Se quero tirar uma pós-graduação ou mestrado, arrisco-me a queimar as pestanas e tirar tempo à família, não esquecendo mais 3000€ ou 6000€ de propinas. Em troca recebo mais 0€ ao fim do mês. É isto um estímulo ao desenvolvimento? É assim que a profissão está. É assim que nos sentimos.

13 comentários:

  1. é realmente assustador :S

    ResponderEliminar
  2. Meus amigos, é só copiar e enviar para:

    Jornais, TV, rádios, ministra da saúde, primeiro ministro, PR, etc ...

    ResponderEliminar
  3. contra a precaridade. vão a:

    http://maydayporto.blogspot.com/

    juntos seremos muitos. é urgente mudar.

    abraço guilherme

    ResponderEliminar
  4. "O que move uma pessoa não são os músculos, e sim a força do pensamento".

    (Aldous Huxley)

    ResponderEliminar
  5. poderia ter sido eu a escrever... É um eco do que penso diariamente e não vejo mudança à vista!

    eu por mim aderia a uma greve radical: contínua e sem cuidados mínimos. sempre queria ver a classe médica em conjunto com as auxiliares a segurar as pontas!

    E todos em greve em frente ao parlamento. Eu levo tenda. Se não arredarmos pé e com os hospitais e centros às moscas aindo nos imploram para voltar!!!! É só querer. Ninguém alinha? É que qualquer dia estamos com o ordenado mínimo, e só não ganhamos menos porque não é possivel!!!


    Deviamos ser mais radicais.

    ResponderEliminar
  6. Dia 12 de Maio será Greve dos Enfermeiros e para já as greves tem funcionado ! Vejamos a a aprovação do Modelo as cedências ultimas. Vamos para a frente que esse é o caminho!

    ResponderEliminar
  7. Quem quiser escrever uma pergunta ao nosso Primeiro Ministro (exemplo carreira de enfermagem) passe no Cogitare em Saúde.

    ResponderEliminar
  8. http://doutorenfermeiro.blogspot.com/2009/04/andam-fazer-batotice-em-ponte-de-lima.html

    ResponderEliminar
  9. O grande problema dos enfermeiros foi,é e será o facto de em todos os seus comentários,em todas as suas reinvindicações se tentarem equiparar aos médicos.
    São profissões diferentes porém complementares,em vvez de reclamarem que o médico recebe 2400€ reclamem com a Ordem dos Enfermeiros por não vos defender.
    Ao falarem só nos médicos perdem credibilidade pois para o Ministério as vossas reinvidicações não passam de queixinhas.

    ResponderEliminar
  10. Robin dois Hospitais23 de abril de 2009 às 18:36

    Grande parte dos enfermeiros não procura equiparar-se aos médicos. Alguns poderão tentar fazê-lo, terei que concordar contigo, mas a maioria dos enfermeiros, onde eu me insiro, quer la saber que o medico ganhe isso ou mais... para mim ate podia ganhar 20000 euros, desde que eu não ganhasse pouco mais de 900. O medico terá sempre que ganhar mais que o enfermeiro, não se põe isso em causa... estudou mais, terá (eventualmente e na generalidade) mais responsabilidades. Mas eu também estudei, tirei uma licenciatura, procuro investir constantemente na formação e ganho xiolas.. mas realmente somos uns queixinhas, porque somos uns miseráveis, porque somos mais que as mães. A Ordem?! O que é que tu sabes da Ordem, o que é que um medico poderá saber da Ordem dos enfermeiros?! Ao falarem só nos médicos??! acho que te enganaste... raramente se tem falado neste blog de médicos.. e olha que eu ando muito atento. Já agora.. reparo que das-te bem com o MS e a ministra.. diz-lhe que o Robin anda por ai.. a roubar os ricos para dar aos pobres!

    ResponderEliminar
  11. Sou estudante de enfermagem e quando entrei para o curso pensei em prosseguir estudos na carreira depois de acabar a licenciatura, hoje nem sei se valerá a pena terminar o curso ainda para mais quando sinto que a Ordem não estará cá para nos defender e ainda cria um ano de internato em que directamente dizem a nós estudantes que teremos de ser nós a reinvindicar salário junto das instituições (basicamente os que apanharem com isto vão trabalhar à borla e as instituições não se vao dar ao trabalho de pagar o que têm de borla).
    Já pensei como alguém que nos comentários disse que se parássemos por completo talvez nos ouvissem, mas se não forem os enfermeiros o que será feito dos doentes que estão internados? Serviços como a UCI e serviços bem específicos em que os enfermeiros são indespensáveis? Talvez pudessemos quase parar por completo, mas assegurar serviços minimos em alguns serviços...
    Dia 12 se puder, lá estarei, ainda não fui a uma manifestação destas, mas creio que esteja na hora de também os estudantes se juntarem porque seremos os enfermeiros de amanhã e se não apoiarmos a classe hoje não vai valer de nada choramingar depois.

    ResponderEliminar
  12. Olá Guilher-me, fiquei chocada com este texto.
    Importas-te que o publique no meu blog?
    Darei os devidos créditos (direi que tirei daqui).
    Isis.

    ResponderEliminar
  13. Cara Isis,
    Estás avontade de o publicar. Penso que o sei autor não levará a mal, seja ele quem for.

    Cara EE MF,
    É bom que os alunos se juntem a estas causas, é importante para vós, porque é o vosso futuro q esta em causa e é importante para os enfermeiros em geral, porque haverá maior impacto.
    Compreendo a tua magoa ou frustração, é sem duvida o momento de lutar. Quanto ao ano de internato, ter que "reivindicar junto das instituiçoes".. acho que tas mal informado, não é isso que se espera. Acho que a aprovação do Modelo de desenvolvimento profissional, foi um grande avanço para enfermagem, claro que ainda vamos ver o que isto vai dar.. mas com isto a ordem tera mais poder, coisa que nos dias que correm ainda nao acontece de facto. Acho que vamos sair a ganhar, não podemos ser tao pessimistas
    G.

    Organizem-se nas escolas e mobilizem-se

    ResponderEliminar